CLÉU ARAÚJO
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Babies

por: Cléo Araújo

26 DEZ

2014

Seres que vêm de nós.

Comem de nós. Penduram nas nossas tetas.

E as pessoas criam, desejando o melhor, só o melhor, mais que o melhor, se algo assim tão incrível houver.

Não tive nenhum. Nem por querer, nem sem querer.

Já pensei, um dia, que um viria. Não veio. Nem vieram. Nada que um teste de farmácia não desse acalento na alma, depois do não, da certeza do não, da calma do não, do ufa do não. “Ufa”, aliás, é tudo que eu consigo pensar até esse quarto parágrafo de um texto que fala sobre seres pendurados nas minhas tetas pela eternidade.

A verdade é que filhos são seres egoístas. Eu sou filha, eu sei. Só querem, só pedem, só exigem e não dão nada em troca antes de você ter completado 78 anos de idade.

A mulher que assume o compromisso de parir, por isso tudo, para mim, é uma diva. Primeiro porque fica cerca de 15 meses sem beber, sem comer um cheddar Mc Melt, sem pintar os cabelos e com uma certa implicância hormonal do homem que a inseminou, coitado dele, num ato de solidariedade masculina inevitável. A mulher que pare, a meu ver, é uma deusa do Olimpo eterno. Um ser sublime que consegue compreender o amor antes mesmo de ele existir, e capacidade maior de abstração, creio eu, não deve haver.

Tiram o sono, fazem cair as tetas, o períneo, dão olheiras e cagam em literalmente tudo que você tem na sua vida.

Aí penso na bruxa de João e Maria, por exemplo. Penso em quão mal compreendida essa mulher das fábulas é. A mulher constrói uma casa dos sonhos, linda, doce e aconchegante e os dois fedelhos chegam lá, sem serem convidados, e começam a comer as paredes, a foder com tudo, o que mais se esperar dessa mulher que não que ela os prendessem num calabouço para ensinar-lhes boas maneiras e respeito ao que é do outro? Coisa que pouca mãe faz. Afinal, mãe é mãe, não é bruxa, dizem.

O filho tem sua cara, seu jeito, mas não é você. O filho sai do seu útero, sai sem falar, sem andar, sem respirar, ou pelo menos é assim que toda mãe pensa, eu vejo, quando passa a noite insone e sem vinho observando o ser no berço.

O ser, que ainda pouco sabe a que veio, nasceu e, um dia, vai crescer. Vai ser uma pessoa estranha, que você vai ter que interpretar, ajudar, guiar, deixar se foder.

Um filho é você fora de si.

É você em 3D.

Não me impressiona nem um pouco que não os tenha tido.

Lindos, frágeis, perdidos na vida.

Por melhores que sejam, uma vez seus, são você do lado de fora.

O mundo já é tão difícil sem eles.

Com eles, então, beira o insuportável.

Esse era um texto bonito para um 1º de maio, mas não acho que as mães mereçam nem precisem de homenagens em dias comerciais, selecionados.

Mãe, toda mulher é um pouco. Mesmo sem ter tido filhos. É a mulher que abre mão de si. Que abre mão de uns anos da sua vida para simplesmente ver, assistir e amar sem querer nada de volta.

“Ufa”?

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