Disseram por aí que o verão acabou. E enquanto o outono finge que começa eu corro os olhos por esses três primeiros meses do ano que, pelo menos no que diz respeito à minha agenda, têm seus dias estranhamente recheados por programas, compromissos, eventos, lances, episódios mil que simplesmente… Não aconteceram! Bom, ok, alguns aconteceram sim, mas à completa revelia do fato de eles estarem registrados na minha agenda.

Foram fatos que não contaram com a minha participação. Um lugar para o qual eu me programei pra ir, mas para o qual não fui; um objeto que eu precisava comprar, mas que não comprei; uma tarefa que eu deveria realizar, mas que deixei passar.

Eu escrevi lá, num 14 de fevereiro qualquer, uma coisa que supostamente estava marcada para aquela data, um acontecimento que deveria ter contado com a minha presença. Mas que, por interferências externas ou preguiças internas, simplesmente não aconteceu. E aí, eu penso.

Se tudo de não acontecido tivesse, de fato, acontecido, das duas uma: ou eu estaria muito cansada e muito, mas muito pobre mesmo antes de abril começar ou eu estaria radiante, reluzente, com uma garota pop e de agenda cheia deve se sentir.

Se tudo aquilo fosse verdade, enfim…

… eu teria comprado um chapéu panamá pra mim, naquela lojinha da R. Augusta;

… eu teria entrado com o pedido para o visto americano para visitar minha amiga em Nova Iorque;

… eu teria conseguido o visto americano, embora essa se tratasse de uma tarefa que fugia por completo do meu controle;

… eu teria ido assistir o Fantasma da Ópera;

… eu teria feito branqueamento nos dentes;

… eu teria assistido Match Point;

… eu teria ido ao show do U2 com ingressos comprados com antecedência;

… eu teria ido ao show do U2 de última hora, na certeza de encontrar um cambista que me venderia um ingresso por vinte reais;

… eu teria feito matrícula na academia do lado de casa;

… eu teria ido ao dermatologista;

… eu teria cortado o cabelo;

… eu já teria ido ao Museu da Língua Portuguesa;

… eu teria ido almoçar no East;

… eu teria ido renovar a minha carteirinha da OAB (sim, eu sou advogada, embora nem a carteirinha seja nova o suficiente para provar isso);

… eu teria feito a assinatura da revista Viagem e Turismo;

… eu teria ido para Nova Iorque;

… eu teria ficado no Cosmopolitan Hotel, em Tribeca;

… eu teria feito mil coisas em Nova Iorque;

… eu teria aberto uma aplicação financeira, e agora percebo que teria sido minimamente inteligente fazer isso antes de realizar os três itens acima;

… eu teria arrumado minhas gavetas de blusinhas;

… eu teria feito um happy hour com minha amiga Ana, pelo menos umas catorze vezes;

… eu teria feito um jantar em casa para minhas amigas;

… eu teria organizado uma viagem para África em setembro;

… “O Segredo Brokeback Mountain” teria levado o Oscar, embora isso fugisse completamente do meu controle;

… eu teria um cachorro chamado Otto ou uma cachorra chamada Gerusa;

… eu teria tirado uma foto 3 x 4 para renovar a minha carteirinha da OAB;

… eu teria comprado um presente para o meu amigo Kuba no aniversário dele;

… eu teria trocado a lâmpada do meu micro jardim;

… eu teria mandado trocar a borracha da minha geladeira;

… eu teria procurado escolas de esqui em São Paulo. Não me pergunte por que, mas isso está escrito lá;

… eu teria copiado a agenda do meu celular velho para o meu celular novo;

… eu teria passado essa agenda a limpo.

O mês é abril. Nem o primeiro quarto do ano terminou. E dessa lista imensa de tudo que eu ainda não fiz só consigo pensar no que ainda dá tempo de se fazer ainda este ano. Talvez abril seja um bom mês para se parar de desistir. Tomara que seja mesmo. Porque aí junho vai ser especial, setembro inesquecível. Quando, em meio ao começo da primavera, eu sair a passear pelas ruas de São Paulo de chapéu panamá, munida da minha carteirinha nova de advogada e com Gerusa pela coleira, chamando a atenção de todos os passantes.