CLÉU ARAÚJO
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Entre o Botafogo e as Laranjeiras

por: Cléo Araújo

15 OUT

2004

O Nando Reis e a Cássia Eller disseram, na letra de All Star, que “estranho seria se eu não me apaixonasse por você”. E é meio assim, senão totalmente assim, que eu me sinto hoje. É que o bairro das Laranjeiras ficou longe, embora muito próximo do que eu sinto agora, nessa noite que antecede amanhã. Amanhã, que é um dia qualquer.

Eu nunca acreditei em destino, mas calhei de conhecer uma pessoa em meio à situação mais inusitada que poderia imaginar, completamente fora da minha vida day-by-day, embora absolutamente encaixada na minha vida de ficção. E aí, que raio de culpa tenho eu?

Vivo numa cidade onde os prédios me circundam, onde as pessoas prediais me cercam. Onde não tem mar, senão com uma Imigrantes inteira entre nós. Não pego o mar no trânsito. Não tenho o mar batendo na minha janela. Nem do carro, nem de casa. O mar, pra mim, é coisa rara, coisa de férias. Eu não moro na Lagoa. Moro nos Jardins.

Tenho vontade do mar. Como sempre. Fico defendendo feito louca que não sou uma pessoa verão, que não sou uma pessoa da água, do sol. Mas toda vez que me pego pensando, é exatamente disso que sinto falta. Do mar, do sal, da brisa que sopra.

Acho que devia me mudar daqui. Dos prédios e dos escapamentos. É que os escapamentos ficam insignificantes quando o mar está ao lado. Pessoas que não têm o mar na alma. Ai… essas pessoas sem ar, sem horizontes. É que, com a licença de estar vivendo numa vida de ficção, o meu roteiro tem o mar. Tem um último beijo dado em cima de uma onda quebrando, com a água gelada pegando no tornozelo e dando um frio na coluna.

E essas pessoas que aparecem sem a gente pedir? Tipo, quando – sem saber por que – hesitamos em ir a um lugar, meio que como sabendo que algo de estranho lá está esperando. Pessoas tipo o mar, que eu sei que não vou encontrar aqui, na padaria do lado de casa. Vou pro mar só às vezes, duas vezes por ano. E quando encontro pessoas no mar, sinto como se devesse ficar embaixo da serra.

Pessoas tipo mar, daquelas que a gente só deve ver no Carnaval e no Réveillon, às vezes cruzam nosso caminho. E a gente tem que encarar, olhar pra elas, saber lidar com elas. Ainda que seja no besta mês de outubro.

E tentar terminar a conversa um dia desses, quando der. Num outro dia de mar. Porque a conversa ficou pelo meio, em algum lugar entre as Laranjeiras e o Botafogo. Ficou pra amanhã. Quando alguém apertar o 12 que, por acaso, é sim o meu andar.

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