CLÉU ARAÚJO
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Pelas tribos

por: Cléo Araújo

19 JAN

2007

Pretendo conseguir me envolver só com quem eu tiver certeza de que me encontrarei de novo depois de um eventual rompimento. Não para ser amiguinha, mas porque é muito injusto colecionar pessoas que somem.

Percebo que talvez eu jamais venha a me encaixar aos guetos e subguetos da cidade grande, especialmente aqueles formados por indivíduos de trinta anos (margem de erro de dois pontos para mais ou para menos). Noto que jamais pertenci a nenhum gueto e a nenhum subgueto na cidade pequena, e isso porque eu passei vinte anos por lá.

Preciso de uma coisa mais neutra, de células sociais que, ainda prontas e completas, me aceitem, mesmo que me achem pitoresca, “forasteira na cidade grande”, “peregrina na cidade pequena”, como às vezes alguns gostam de me ver, cá e lá.

Preciso assumir que, por vezes, sou sim muito menos provinciana do que quem nasceu e se criou aqui, na megalópole, e que do interior só conhece São Roque e já o deu por visto.

Preciso de uma pessoa neutra, indivíduo que, embora pronto e completo, me aceite, mesmo que me ache pitoresca, “forasteira na cidade grande”, “peregrina na cidade pequena”, como às vezes alguns gostam de me ver, lá e cá.

Enquanto sem tribo, sem par, pareço só tatear a vida, e às cegas, sentindo que a cada dia fica mais tarde para acreditar que alguém especial vai me acarinhar os cabelos, me por no colo, me querer mais do que tudo. Odeio achar que não basta o “companheiro, o “amigo”, o que “gosta de mim”. Irrita-me querer algo compatível ao meu tempo de espera e às minhas frustrações. Aborrece-me esperar pela onda de paixão digna de quem sempre morreu na praia. Odeio, me irrito e me aborreço porque isso tudo é prova cabal da minha falta de maturidade, do meu romantismo, da minha quase estupidez… Coisas que eu já comecei a querer mudar sobre mim mesma nos últimos meses.

Peço licença para falar de todos os que já passaram por mim, tenha eu os visto ou não. Aliás, aos que eu não vi, peço que, por favor, voltem, passem por mim de novo. Eu continuo aqui, curiosa de tudo que não conheço. Já aqueles que passaram vistos, peço que, por favor, me expliquem: onde é que vocês foram parar?

Ah, como eu pretendo conseguir me envolver só com quem eu tiver certeza de que me encontrarei de novo depois de um eventual rompimento. Não para ser amiguinha, não… Mas porque é muito infantil colecionar pessoas que não existem.

Gostaria tanto de poder levar a vida na mochila, e não nessa pasta de couro com cadeado e trava anti-furto de titânio. Adoraria aprender, de hoje para amanhã, a ser um pouco mais esquisita e desligada das coisas e das pessoas.

Aí eu usaria roupas estranhas, seria confusa e confundiria.

Aí eu andaria pelas tribos, feliz, estranha, cosmopolita, provinciana, forasteira, peregrina e pitoresca. Cá, lá e em todo lugar.

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