CLÉU ARAÚJO
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Saudades de Honoré

por: Cléo Araújo

09 FEV

2009

Foi há cerca de sete anos, num amigo-secreto, que ganhei de presente esse livro.

Ele contava a história de uma trintona inglesa, bastante engraçada, que se metia em várias enrascadas tentando encontrar um amor.

Eu tinha uns vinte quatro anos.

No ano seguinte eu mesma adquiri, por minha conta, o segundo volume da saga. Neste, a mesma trintona inglesa continuava se metendo em várias enrascadas (algumas ridículas) tentando encontrar (ou seria reencontrar?) um amor. Foi só um ano depois daquela primeira vez, e eu já não achei nada tão engraçado assim. Engraçada, a essas alturas, só mesmo a briga entre Mark Darcy e Daniel Cleaver reproduzida no cinema.

O fato é que, naquele tempo, algo imperceptível já começava a me incomodar na história dessa tal dessa Bridget Jones. Mas foi só recentemente, talvez no momento em que eu mesma me tornava uma trintona, é que me dei conta, racionalmente, de que essa fulana é uma jacu completa.

Hoje as situações já até me parecem mais familiares. Mas as ações e reações de “Bridge”? Jamais. Aliás, a única coisa decente e minimamente aceitável que ela faz é encher a cara de Chardonay sempre que possível. Mas, na verdade – e esteja ela ou não no limite da razão – Bridget Jones é uma palerma.

Qualquer mulher que se encontre com trinta anos de idade (pouco mais, pouco menos) e esteja fazendo as mesmas patacoadas boçais que essa personagem faz (e que, justiça seja feita, são maiores no cinema do que na literatura), precisa, no mínimo, de um psicanalista (ou de um pediatra, ou de um exorcista). Bridget é infantil, insegura e adolescente. E que, por favor, não me entendam mal as crianças e jovenzinhos com menos de dezoito anos porque vocês vivem as experiências da Bridget dezessete anos antes dela, ou seja, na hora certa.

As babaquices que Miss Jones comete ao longo das suas aventuras são tantas que fica difícil mapeá-las. Mas aquela, em que ela começa a imaginar seu sobrenome de casada com o rapaz com quem namora há três meses, é um clássico. Cá entre nós, se você faz isso e já saiu da quinta série, não comente, por favor. No máximo escreva no seu diário. Mas certifique-se de que ele não será lido. Nunca. Por ninguém.

Bridget, além de paspalha, é influenciável e um tanto burra, também. É um milagre, realmente, que consiga emprego em Londres, a tal da Bridget; que, aliás, ganharia fácil o prêmio de rainha das gafes de toda a Grã Bretanha. Na primeira, ok, é engraçado. Na quinta, e quando já bombardeada por olhares reprovadores e descrentes, você começa a desconfiar de que a pobre possa sofrer de algum distúrbio de déficit de atenção ou de um Alzheimer precoce.

Bridget, pobrezinha, é nada mais, nada menos, do que patética. Não tem nenhuma crítica, é egoísta e completamente alienada. Mas, mais triste do que perceber Bridget como sendo essa caricatura podre da mulher de trinta anos que convenceu tanta gente (inclusive a mim), foi perceber que, embora ela possa sim prestar um desserviço a qualquer mulher, em qualquer idade, ela não é inverossímil. Não, leitores. O problema é que há muitas Bridgets povoando o mundo. O problema é pensar que olham para nós, as verdadeiras mulheres de trinta anos, pensando: “lá vai uma Bridget”. E isso dói.

Agora, não esperem encontrar verossimilhança em outros aspectos da história da vida dessa mulher. Afinal, quem, em sã consciência, acreditaria que um cara um pouco mais elaborado – como supostamente seria o tal advogado metidinho Mark Darcy – se daria ao trabalho de perseguir uma fulanazinha vazia e fútil do naipe de Bridget, a ponto de tirá-la de uma cadeia na Tailândia? É aí que a ficção me tira do sério. Vá lá do cara se apaixonar durante um surto ou um porre, mas daí a acreditar que esse homem faria loucuras para ter uma bocó feito aquela ao seu lado, é ludibriar o censo crítico de quem quer que seja que tenha alguma noção e tenha entrado em contato com essa história.

Sei que, de Balzac a Helen Fielding, passando por Carrie Bradshaw, a única saída parece ser respirar fundo, tomar coragem e mergulhar. Com um pouco de sorte, os anos passarão depressa.

Isso, é claro, se ninguém tiver a brilhante idéia de criar uma heroína quarentona. Uma “loba” abestalhada… Só para nos perturbar.

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